quarta-feira, 16 de abril de 2014

Sou Melhor Do Que Você

Nicki não se encontrava em casa quando houve o telefonema. Sua colega de apartamento estava excitada demais para apresentar um relatório coerente. Ela não tinha muita certeza do lugar em que o Sr. Wolfe vira Nicki atuar: se na peça da temporada de verão, na aparição de dois minutos em Gypsy ou no comercial de televisão para um aspirador. Mas que diferença isso podia fazer? Nicki deveria apresentar-se no Broadhurst Theatre, às 4 em ponto, se quisesse ter uma audiência. Nicki ficou tão excitada que saiu da pensão sem nem mesmo passar um pente pelos cabelos louros emaranhados. Percorreu a pé os 13 quarteirões até o teatro, não querendo permitir-se a indulgência de um táxi. Poderia conseguir um lugar na peça, é certo, mas o elenco vinha sendo escolhido há mais de um mês e agora só deveriam restar os papéis secundários.

Havia apenas cinco pessoas no palco quando Nicki chegou. Quatro mal a olharam quando ela avançou, hesitante, até a frente do palco. O quinto, um homem de aparência ainda jovem, o rosto ossudo, vestindo um pulôver, aproximou-se dela, sorrindo. Nicki sabia que era Wolfe, o diretor, importado de um teatro dos subúrbios, em sua estréia na Broadway, com uma nova comédia.

— Eu a conheço — disse ele. — Você é Nicki Porter. Obrigado por ter vindo.

— Eu é que lhe agradeço — disse Nicki tímida, usando sua voz rouca e sonora.

Nicki não era extraordinariamente bonita nem mesmo provocantemente comum. A sua melhor característica era a voz.

quarta-feira, 2 de abril de 2014

O Quarto Vazio


O portão rangeu, com um suave queixume feminino, quando eleo fechou, depois de passar. O barulho fê-lo parar por um momento no caminho e olhar para a casa. A casa estava às escuras, avultando sombriamente na noite escura. Ele se perguntou se ela não estaria acordada, se o rangido do portão por acaso não a despertara. Mas realmente não se importava. As coisas já tinham ido tão longe que ele já não mais se importava com coisa alguma. As cenas estavam começando a deixá-lo nervoso demais. Já não mais agüentava as constantes repetições, as acusações (que não mais se dava ao trabalho de negar), as censuras intermináveis. Ele subiu pelo caminho e pelos degraus da varanda, tirando a chave do bolso. Entrou na casa, fechando a porta. E no mesmo instante sentiu a hostilidade, o ódio gerado pela presença dela, pelo ressentimento constante dela.