segunda-feira, 16 de abril de 2018

O Congresso Dos Anticristos


Davi era diferente. Desde criança, havia uma crueldade naquele menino, um ódio no olhar, maldade nas ações.

No jardim de infância, ele decepou o dedo dum colega com estilete; na primeira série, furou o olho duma menina com um lápis; na terceira série, enfiava ratos mortos nas bolsas das professoras.

Passagens pela polícia, diretoria e conselho tutelar foram inúmeras.

Joana, sua mãe, não sabia a quem mais recorrer, visitou psicólogos, padres e a cinta lambia a bunda do menino quase que diariamente.

Numa manhã, Davi despertou Joana.


quinta-feira, 12 de abril de 2018

Tripas - Chuck Palahniuk


Inspire.

Inspire o máximo de ar que conseguir. Essa estória deve durar aproximadamente o tempo que você consegue segurar sua respiração, e um pouco mais. Então escute o mais rápido que puder.

Um amigo meu aos 13 anos ouviu falar sobre “fio-terra”. Isso é quando alguém enfia um consolo na bunda. Estimule a próstata o suficiente, e os rumores dizem que você pode ter orgasmos explosivos sem usar as mãos. Nessa idade, esse amigo é um pequeno maníaco sexual. Ele está sempre buscando uma melhor forma de gozar. Ele sai para comprar uma cenoura e lubrificante. Para conduzir uma pesquisa particular. Ele então imagina como seria a cena no caixa do supermercado, a solitária cenoura e o lubrificante percorrendo pela esteira o caminho até o atendente no caixa. Todos os clientes esperando na fila, observando. Todos vendo a grande noite que ele preparou.

Então, esse amigo compra leite, ovos, açúcar e uma cenoura, todos os ingredientes para um bolo de cenoura. E vaselina.

Como se ele fosse para casa enfiar um bolo de cenoura no rabo.

Em casa, ele corta a ponta da cenoura com um alicate. Ele a lubrifica e desce seu traseiro por ela. Então, nada. Nenhum orgasmo. Nada acontece, exceto pela dor.

Então, esse garoto, a mãe dele grita dizendo que é a hora da janta. Ela diz para descer, naquele momento.

Ele remove a cenoura e coloca a coisa pegajosa e imunda no meio das roupas sujas debaixo da cama.

quarta-feira, 11 de abril de 2018

A Tumba - H. P. Lovecraft


Ao relatar as circunstâncias que conduziram ao meu confinamento neste asilo de loucos, tenho consciência de que minha posição atual criará dúvidas naturais acerca da autenticidade de minha narrativa. É grande infortúnio o fato de que o grosso da humanidade seja limitado demais, em sua visão mental, para pesar com paciência e inteligência esses fenômenos isolados, vistos e sentidos apenas por uma minoria psicologicamente sensível, os quais jazem fora de toda experiência comum. Homens de intelecto mais amplo sabem que não existe nenhuma distinção precisa entre o real e o irreal; que todas as coisas aparecem como tais apenas em virtude dos delicados meios psíquicos e mentais de cada indivíduo, por meio dos quais nos tornamos conscientes delas; mas o materialismo prosaico da maioria reputa como loucura os lances de visão superior que perfuram o véu comum do empirismo óbvio.

Meu nome é Jervas Dudley, e desde a mais tenra infância tenho sido um sonhador e um visionário. Rico para além das necessidades de uma vida comercial, e de um temperamento inapto para os estudos formais e o recreio social daqueles com quem me relaciono, tenho lidado desde sempre em reinos que não pertencem ao mundo visível, passando minha juventude e minha adolescência debruçado sobre livros antigos e pouco conhecidos e a percorrer os campos e bosques das cercanias de meu lar ancestral. Não creio que o que li nesses livros ou vi nesses campos e bosques fosse exatamente o que os outros rapazes leram e viram ali, mas sobre isso preciso falar pouco, pois que discorrer mais detalhadamente apenas confirmaria essas calúnias cruéis acerca de meu intelecto que às vezes ouço sussurrarem os atendentes furtivos que me rodeiam. Basta-me relatar os eventos, sem analisar as causas.

quinta-feira, 5 de abril de 2018

Os Estranhos Habitantes de Soledad


A família sempre reputou minha tia-avó como louca. Mas família é família, e se faz necessário encontrar um bode-expiatório, determinar quem é a ovelha negra. Assim, tem-se farto material para fofocas quando há reuniões familiares, e o comportamento misantropo de Joaquina só favorecia esta situação.

Talvez ela fosse realmente louca, ou apenas excêntrica. A verdade é que ela — por opção? — nunca havia se casado; uma aberração, se comparada às irmãs, que não apenas se casaram, como botaram no mundo dúzias de filhos, redundando em uma centena de netos.

Joaquina lutou pelos direitos da mulher na juventude, organizou grupos de teatro, redigiu manifestos contra o Estado Novo, foi presa, apanhou, opôs-se à Guerra Mundial e à exploração da classe trabalhadora, foi exilada no Chile e, quando retornou, finalmente obteve reconhecimento em sua carreira literária com obras de cunho feminista, se se procurar, é possível encontrar o nome dela na listagem dos Mais Vendidos da VEJA, durante o mês de setembro, em meados dos anos 80.

Com o dinheiro dos livros, Joaquina comprou um terreno no interior e construiu uma mansão. Convidou-me várias vezes para visitá-la, tinha-me em grande consideração (porém, a recíproca não era verdadeira), mas sempre encontrei escusas para me eximir da obrigação.