Começou aos poucos, quase sem ser notado. As crianças foram as primeiras a sentir os efeitos, parando no meio das brincadeiras de pega-pega, esquecendo o futebol pela metade, preferindo montar quebra-cabeças à correria. Depois o boato tomou as conversas em bares, as janelas leva-e-traz das faladeiras, os programas de entrevistas, até virar notícia oficial, grave em seu chamado de cadeia nacional, transmitida a cada povo do planeta por seu próprio governante.
Não se sabia a origem do fenômeno. Nos botecos, diziam que a Terra atravessava uma região do espaço ocupada por elementos de anti-matéria que sugavam a atmosfera. As tevês culpavam os raios solares, a camada de ozônio, o El Niño. Saltando de janela em janela, entre fofocas e ladainhas, um versículo do Apocalipse ecoava: “e o sétimo anjo derramou sua taça pelos ares”. Não havia consenso, mas o fato é que a Terra, como um balão cheio de minúsculos furos, vazava gases para o cosmos.
O mundo estava perdendo ar.